Sábado, 31 de Outubro de 2009
Nunca acreditei no para sempre, mas pensei que tu irias estar sempre comigo, fosse a que distância fosse, por mais mágoa que houvesse e por mais saudades e orgulho que estivesse envolvido.
Agora não estás comigo e tudo o que treinava e adicionava, dia após dia, para te dizer, confessar, desculpar-me, não pode ser dito - não me ouves. Talvez ainda esteja em transe e ainda não acordei para a realidade. Talvez tudo não passou de um pesadelo e amanhã ligarás para casa, novamente, para falares com a mãe. Iria-te despachar, para ouvir o menos da tua parte, para me manter forte - e teimosa! - e mostrar-te que ainda estava magoada.
Porém, já te tinha desculpado e apenas o que residia em mim era mágoa, por não me teres defendido, por deixares dizer tudo aquilo sobre mim. Talvez por saber que ÉS meu e que antes não te tinha que te partilhar com ninguém.
Foi duro não poder ver-te novamente, o teu rosto, cheirar o teu perfume - o de há tantos anos - ou de não ouvir as tuas piadas medonhas. Sabes, foi difícil não olhar para ti e saber que estavas bem - não estavas, já não estavas.
Foi - está a ser - uma experiência aterradora e nenhuma sensação se iguala à dor de te perder, de perder, para sempre, alguém que se ama, alguém que é dos nossos. És meu, irmão! Por mais que odeie a estúpida da mota que te trouxe o teu fim trágico, relembro-me de te ver sempre acompanhado por ela. Ela tinha que ser a tua desgraça, não é verdade?
Como é que ultrapassamos isto? Como é que tento acalmar a mãe e o pai, dizer à avó que temos que seguir em frente, mostrando-me forte se quando me apanho sozinha não consigo pensar assim? Porque é que me arrependo profundamente de nunca te ter dito que te amava! Nunca! Será possível? Demonstrei-to? Não me lembro...
Agora só queria retroceder até ao dia 28 e parar-te. Ou então, estar no teu lugar. Não me importava, sabes? Morrer no lugar de quem se ama não me parece um acto de loucura, parece-me um acto de amor, amor que nunca soube dar e que sempre mereces-te.
As memórias são poucas, os momentos que passámos foram tantos mas a tua mudança, teres mudado de casa - o que me sempre magoou - apagou-me tudo o que tinhamos. Talvez por saber que te queria aqui, por mais que dissesse que não. Talvez por saber que te amava e que éramos demasiado iguais. Talvez por saber que me achavas a menina perfeita e tu o delinquente.
Deixaste-me um presente, a nós, à nossa família e sabes que por mais que o tivesse desprezado até aqui, sempre o quis ao pé de mim. Sabes, o teu filho conquistou-me. Sabes, ele é parecido contigo à maneira dele. Os caracóis que bailam incessantemente e o riso traquina. Até o teu mau feítio tem, já viste? Deixaste-nos, é nosso. É meu. O meu sobrinho. Será que um dia me irá chamar de tia? Será que um dia me reconhecerá?
A maneira como se escondia de mim e se ria, envergonhado, encheu-me o coração de alegria, por mais que ele transbordasse de dor. Mesmo assim, as lágrimas não terminavam e hoje, ainda apática, acho que já não as tenho, porque já não as consigo deitar cá para fora. Das duas uma: Ou porque já as gastei todas nos dois dias mais traumatizantes de minha vida - ter que me despedir de ti e ver-te a desaparecer por entre nós - ou porque tudo isto ainda me parece irreal.
A altura, provavelmente, não é a mais indicada para escrever, para deixar fluir o que sinto, mas precisava de o fazer. Usar as palavras nuas e cruas, usar palavras fortes, porque a dor é forte. Perdi-te. A mãe perdeu-te. Os manos perderam-te. O teu filho perdeu-te. A tua mulher perdeu-te. Todos os teus amigos perderam-te. E sabes, eras amado por todos, toda a gente gostava de ti. Eu gostava de ti. Quero-te aqui.
Se não tivesse que ser forte pelos pais, talvez as coisas seriam diferentes. Talvez estivesse a afundar, sem retorno à vista. Mas sabes, mano, não posso perder os pais também, não os posso perder. Aceitar nunca, mas temos que seguir a nossa vida, temos que o fazer por nós e por ti. Por o teu menino. O nosso Menino. Estás longe, a 2h de distância, a não-sei-quantos km, mas sabes? Estás tão perto que não te imagino longe. Sei que estás a ler o que te escrevo, sei que estás connosco e que sempre que olho para a tua foto, sei que ainda estás aqui. E estás! Seremos para sempre 5, eu e as manas e o mano. E tu! Sempre, eu prometo. Nunca, mas nunca, me irei esquecer de ti. Mas agora, por mais que não me consiga concentrar, por mais que seja difícil, tenho que me focar e fazer-te orgulhar, durante muito tempo, da única coisa em que sou boa: na escola. Irei lutar sempre e, se em algum minuto me esquecer do sucedido, não me relembres. Queres saber porquê? Porque estás sempre comigo e pensar que estás vivo é mais fácil. E estás. Estás longe, mas comigo.
Mano, como é que foi possível? Como é que vamos superar?
Oh, mano, porquê?
Por favor, volta.
Volta...
Faria tudo de novo.
Desculpa por tudo o que disse e o que não fiz.
AMO-TE e ninguém muda isso. E até sempre, esteja o mundo dividido da maneira que estiver, estarás connosco, comigo.
E prometo, prometo que jamais me irei esquecer dos sapatos que te fizeram crescer, das nossas lutas infantis, da música que partilhávamos e das compras que faziamos juntos. Nunca me irei esquecer das brigas, das queixinhas, da tua voz e da tua maneira de ser. Do teu perfume e da tua cor dos olhos - muito parecidos aos meus -, verdes, lindos. Do teu sorriso, do teu cabelo desgrenhado e do teu fio. Oh mano, nunca me esquecerei de ti.
Proteges-me? Eu preciso de ti. Eu quero-te comigo. Diz-me apenas que é mentira e volta. Volta. Volta...